9 de set. de 2006

Ensaio sobre o sofá


Poucas coisas nessa vida são tão gostosas como ficar deitadão no sofá. Sem pensar na vida, debaixo do edredon, apenas olhando para um ponto fixo no teto. No frio, então, nem se fala.

Nos meus tempos de brejeiro, as minhas férias de julho eram dedicadas em tempo integral ao sofá.

Era um friozinho gostoso na casa de vovó, enrolado em milhares de cobertores, achocolato quentinho feitinho especialmente pela nona... A minha diversão era acompanhar aqueles filmes que passam toda santa férias nas sessões da tarde: Lagoa Azul, Um Tira da Pesada ou qualquer película juvenil que tivesse no final o título "alguma coisa do barulho."

Minha avó se amarrava naqueles programas de culinária. Um, em especial, era o nosso favorito, mas cujo nome me escapa agora pela memória. Era um programa encenado dentro de um supermercado de mentirinha, onde tres casais simulavam fazer compras e, no final, quem obtesse a maior soma dos produtos, sagrava-se o grande vencedor.

O apresentador era um baixinho careca e de óculos. Alguns produtos eram premiados e os competidores tinham os seus braços amarrados. Era um sarro. Ela ria e ria, apesar de algumas vezes eu achar essas tardes de inverno um pouco sacal.

Quando o primeiro friozinho bate sobre minha face e deixa as minhas bochechas vermelhas, logo lembro de minha avó. Da sopa de feijão que ela fazia à noite para esquentar a barriga, como ela dizia, ou de quando eu ia dormir e perguntava: "Gu, você quer mais um cobertor?".

Por mais que eu dissesse que não, não tinha jeito. A velha levantava de madrugada e colocava aquela mantinha extra, cujo cheiro gostoso de amaciante até hoje me tira um sorriso gostoso.

Mas, ao recordar de vovó, não tenho como esquecer de vovô. Um barato o Seu Gilberto. Acordava cedinho para ir até a padaria, comprar todos os jornais da banca e tomar o seu pingado com pão na chapa. Mesmo com um frio dos bravos, com ele não tinha tempo ruim.

Quando eu acordava ele já estava sentado na poltrona da sala, devorando a sua leitura matinal, sempre me dizendo: "Bom dia, ô, alemão! Você viu que o fulano vai jogar não sei aonde?". Era sempre alguma notícia de futebol. Ele sabia tudo sobre o esporte bretão.

Daí, enquanto eu ainda coçava as minhas remelas, fazia-me sentar pertinho dele no sofá e me contava sempre a mesma história, dos tempos em que viajava com o time da Portuguesa de Desportos, a nossa Lusa. Falava dos jogos, dos bastidores das partidas, dos jogadores... Eu adorava, por mais que eu já soubesse cada pedacinho daquelas historietas de cor-e-salteado.

Penso agora se não seria melhor eu mudar o título dessa crônica para "Ensaio sobre meus avós". Mas acho que não, sofá fica mais engraçado, além de uma metáfora para os vários invernos de minha infância. Afinal, era nele que eu passava grande parte de minhas férias, seja jogando videogame, vendo televisão com minha avó ou ouvindo as histórias do Seu Gilberto.

Hoje vovô não está mais entre nós, mas vovó está firme e forte. Moro com ela desde que passei a estudar em São Paulo. Infelizmente, como a vida costuma nos levar, as minhas tardes de inverno hoje são preenchidas pela labuta diária do trabalho.

Mas mesmo estando tão mais próximo e longe dela, a velha ainda me mata às saudades quando prepara uma boa sopa de feijão nesse friozinho ou me acorda de madrugada - por mais que eu ainda finja dormir e não notar - para me colocar aquele cobertor extra sobre o meu corpo.

27 de jul. de 2006

Tecnologia a serviço da morte

Nesses meus primeiros passos da tentativa de me tornar um jornalista, já coleciono diversos casos engraçados. A grande maioria deles vem dos releases que eu recebo.

Já deixo claro que não tenho nenhum problema com os assessores de imprensa. Não sei o que o futuro me reserva. Quiçá um dia não posso estar por aí enviando textos a milhares de jornalistas sobre as maravilhas inexistentes de algum produto, não é mesmo?

Mas, enfim hoje recebi um baita release de mau gosto. Veio de uma funerária. O grande destaque do email é a possibilidade de acender velas virtuais em memória do parente ou amigo falecido. "Como há o costume de acender velas em igrejas, por que não pela Internet?", comentou a administradora do grupo da administradora.

Coloco abaixo o impagável email. No lugar dos nomes das pessoas, do site e da empresa, colocarei um *. Em respeito aos mortos, óbvio.


Tecnologia a serviço da morte

Vela virtual e Memorial em homenagem aos mortos são as novidades do site do *. Informações sobre procedimentos em caso de morte também estão disponíveis

Já imaginou acender uma vela virtual pela intenção ou memória de alguém? Pois hoje em dia, a tecnologia possibilita até ações inusitadas como essa.

No novo site do *, que oferece solução completa para o caso de morte, como Funerária, Velório, Sepultamento em Cemitério Parque (jardim) e Cremação, qualquer pessoa pode homenagear, virtualmente, um ente querido. A vela fica acessa no site durante sete dias, diminuindo a cada dia.

Além disso, na nova web há também, na seção Memorial, um espaço reservado aos usuários que queiram manter ou prestar homenagens aos falecidos, inclusive com a biografia da pessoa.

Segundo *, administradora do *, a idéia da vela virtual e do espaço Memorial surgiu como uma forma de homenagem. "Como há o costume de acender velas em igrejas, por que não pela Internet?", comenta.

"E a proposta do novo site é focada na prestação de serviços, por isso o destaque ao esclarecimento de dúvidas sobre o que fazer em caso de falecimento", afirma. "Os familiares ficam tão transtornados com a situação, que têm dificuldade em agilizar as providências necessárias", diz.

O site traz ainda informações sobre os 30 anos de atuação da empresa, os serviços oferecidos pelo Grupo, entre eles o Projeto de Apoio ao Enlutado, que tem como objetivo atenuar o sofrimento e orientar as pessoas sobre como lidar com as perdas. Respostas a algumas dúvidas freqüentes sobre como proceder em casos de falecimentos, como funciona um crematório entre outras também estão disponíveis.

16 de jul. de 2006

Cores bonitas

A foto (droga de celular com câmera VGA) mostra que Sorocaba está mudando. Sim, por incrível que pareça, banda boa toca por essas bandas aqui (pescou? pescou?). Nessa última sexta-feira, 14, eles, o melhor grupo de rock se apresentou na Manchester Paulista:

Bidê ou Balde!

Depois, do The Calling, nunca foi tão legal ver um show em Sorocaba. Minha gauchada predileta, há dois metros da minha fuça, pulando e sacolejando para um bar de motoqueiros com capacidade para menos de 100 pessoas. Um poleiro com forro de plástico no teto.

Foi tão "afudê!", que comprei uma camiseta deles. E obrigado ao meu grande amigo Filippe, o único de toda a patota a me acompanhar nessa aventura:

- Vamos, lógico! Não sendo Emo, beleza!

8 de jul. de 2006

Três considerações sobre o final de Belíssima*

1) A Claudia Abreu é filha da Fernanda Montenegro. A Claudia Abreu casou com o marido da Isabeli Fontana no início da novela, que na trama era neto da Montenegro. Ou seja: a Claudia Abreu deu para o seu próprio sobrinho! Iu!

2) O que foi aquela fuga da Montenegro? Já vi neguinho escapar pela janela e escapar num carro e ou moto, mas fugir na caruda da polícia a bordo de um jatinho particular foi do caramba! Parecia coisa de vídeogame!

3) O Mau-Mau apalpando e tascando a língua na Fernanda Montenegro. Iuuuuuu!!!!

* Gustavo, ao contrário do que esse post sugere, não é noveleiro. Orgulhoso, afirma ter assistido apenas duas novelas na vida: Vamp e Quatro por Quatro (Carrossel e Chiquititas também, mas essas ele diz que não vale).

2 de jul. de 2006

Uma pena o Brasil ter caído fora da Copa. Digo isso porque vou sentir faltar daquele esquema de sair mais cedo do trabalho para ver o jogo em casa, daquele euforismo das pessoas que ficam mais amáveis...

Aliás, quem deve ter comemorado essa eliminação é a Casas Bahia. Fico pensando na cambada de gente que comprou uma pancada de TVs de plasma na loja antes da competição apenas pela possibilidade, de caso o Brasil faturasse o hexa na Alemanha, ganhar outra de graça, como era dito na promoção.

Teve um monte de pato nessa história. A crença pelo título era tanta, que em apenas uma semana a Casas Bahia vendeu dois mil televisores de plasma de 42 polegadas...

Mas do que eu vou sentir falta mesmo era de como os motoristas de ônibus ficavam mais gentis à cada vitória da seleção canarinho. Daqui do jornal até o ponto de ônibus é uma boa pernada.

Vira-e-mexe, enquanto andava tranquilamente até o destino citado, via o busão que eu precisava voando atrás de mim. Corria, levantava os braços, berrava. Com um certo tesão pela cena, nunca os motoristas diminuíram a velocidade do bicho. Minto: duas vezes: antes do jogo de estréia contra a Croácia e na partida frente ao Japão.

Mas foi só eu erguer uma mão e dar um pique de dois metros para os ônibus reduzirem a velocidade e abrirem a porta lateral. Os motoristas sorriam, os cobradores te cumprimentavam...

Bosta de eliminação!

24 de jun. de 2006

Malditas tabelinhas!

A coisa mais chata que você ganha em época de Copa do Mundo são aquelas tabelinhas de bolso para você marcar com caneta os placares das partidas. Você vai abastecer o carro? O posto t dá uma. Comprar remédio? A farmácia também dá. Incrível como qualquer lugar do mundo tem essas tabelinhas de "brinde".

Outro dia, a caixa da padaria não tinha vinte centavos de troco para mim. "Não faz mal", disse. "Aceito duas balinhas e boa."

"Ah, não pode ser uma tabelinha da Copa para você acompanhar as partidas?", ouvi como resposta.

Grunhi de raiva.

Pelo os meus cálculos, ganhei mais de 30 dessas lembrancinhas. Jamais levava para casa apenas uma, ganhava umas cinco de uma tacada só. "A família vai torcer juntinho", brincou o jornaleiro.

Há duas semanas, enquanto entrava com a namorada no prédio dela, o porteiro veio todo alegre. "Opa, Gustavo! Presente", disse Seu Domingos, com cinco tabelinhas na palma de sua mão.

"Já tenho essa, mas brigado, hein!", respondi, passando reto pela cara de tacho dele. Levei um baita esporro da Bem-Amada. "Mas você não tem educação mesmo!"

Nem no email eu fiquei salvo! Dois amigos meus indicaram uma tabelinha virtual que marcava os resultados e até combinava sozinha as partidas das fases finais. Ignorei.

Politicamente correto, coloquei todas para reciclar. A única tabelinha que eu preencho, religiosamente de quatro em quatro anos, é a quem vem no álbum de figurinhas da Copa (aliás, faltam só duas para eu terminar: escudos de Togo e México - vamos fazer negócios, pessoal!).

Mas, pura ironia do destino, agora de madrugada, enquanto durmo, notei que eu não sabia qual seria o jogo de hoje. Só sei que joga a Alemanha e a Argentina, mas nem imagino o horário. Fui obrigado a sair do quentinho do edredom, ligar a Internet, apenas para ver a que horas rolava a peleja - estou em Sorocaba e o álbum ficou em São Paulo...

Na próxima Copa, juro que guardo pelo menos uma dessas tabelinhas.

20 de jun. de 2006

Bonzinho só se fode

Por diversas vezes eu falei aqui das dificuldades em se arranjar um emprego. Depois que esse martírio acabou para mim no final do ano passado, sempre que posso mexo meus pauzinhos para ajudar aos próximos.

É o amigo que vira fotógrafo de minhas matérias, a namorada que eu indico para uma vaga na mesma empresa, o colega de sala que passa a fazer meus antigos trabalhos de freelancer... Tenho um coração de mãe.

Na semana passada, enquanto abria a caixa de emails aqui do serviço, noto um email endereçado à minha pessoa com o seguinte título: "Bom dia!'. Abro a mensagem e leio com calma:

Prezado(a) Colega,

Remeto meu currículo a fim de participar de um possível

processo seletivo que esteja acontecendo

Renato D. era o nome de meu colega. 26 anos, jornalista formado, casado e pai de um filho. Diz ter trabalhado em vários lugares, e observo que ele não passou nem um ano em cada empresa citada. Inglês intermediário e noções de informática.

Eu, solteiro, morando com a avó e sem filhos já me sentia um merda à procura de trampo, fiquei comovido com a história do sujeito. Coitado, ele tem um filho e é casado, pensei. Respondi ao cara, todo simpático:

Renato, você mandou o currículo para um estagiário. Infelizmente eu não posso fazer nada...

Mas façamos assim: manda pra mim um currículo mais elaborado, mais completinho, no Word. Fale onde você mora, onde fez faculdade, pretensões na carreira, áreas onde gostaria de atuar...

Daí eu deixo ele com o pessoal do RH.

Que tal? Sei como é duro estar atrás de emprego.

Abraço!

Gustavo Miller.

Como sou bacana, não? Pena que o tal do Renato não achou o mesmo. Quatro horas depois ele me responde.

Obrigado pela sua vontade,

amigo estagiário. Deve mesmo

ser "duro ficar sem trabalhar",

no entanto, este não é o meu caso.

E quando ao "Currículo Mais Elaborado"

é realmente necessário a profissionais

em início de carreira. No meu caso,

basta escrever "Editora Abril" ou

"Jornal Diário de Notícias" por exemplo,

que as empresas falam por si.

Ah, vai para aquele lugar!

18 de jun. de 2006

Testando um, dois, três...

Olá, olá!

Ora! Mas vejam só quem voltou? Após eu perceber que ainda existem algumas pessoas que aparecem por aqui e, pasme, cobram-me pela minha ausência, o DPL! está de volta.

Talvez eu esteja mais entusiasmado a escrever com esses negócios de Copa, a qual, confesso, fico super amarradão.

Isso aqui foi apenas um aquecimento. Amanhã eu volto. Deixo a promessa de que tentarei escrever uma ou duas vezes por semana, valeu?

22 de abr. de 2006

O último romântico

Uma coisa que eu adorava em minha infância e adolescência era quando eu e meu irmão jogávamos videogame juntos. Tínhamos diversos games, mas sempre escolhíamos um só: International Superstar Soccer, para Nintendo 64.

Para quem não conhece esse jogo, digamos que ele é o antecessor do bacanudo Winning Eleven.

Batalhas sangrentas eram disputadas. Sempre fui melhor que o mano, e as únicas derrotas que eu levava era quando jogávamos com o goleiro manual - sempre fui péssimo no gol: pulava atrasado, errava o canto...

Uma vez meu tio viu a gente jogando antes do almoço e comentou: "O Gustavo joga de um jeito muito mais bonito. Ele dribla, os laterais avançam, tira a bola sem carrinho, os meias lançam há metros e metros de distancia..."

Óbvio que fiquei feliz com o comentário, e meu irmão uma arara. Eu sempre fui um adepto do futebol arte, da bola passar de pé em pé, de dar rolinho, chapéu, fazer com que o time inteiro soubesse armar uma jogada, como a seleção holandesa dos anos 70 e o seu Carrossel Holandês.

Meu irmão, ao contrário, fazia falta atrás de falta, só fazia gol com um jogador e o seu lema, à Dada Maravilha, era: "Não existe gol feio, feio é não fazer gol."

Com o tempo, fui observando que esse estilo de jogo que eu gostava de aplicar no videogame vinha das primeiras partidas de futebol que eu pude assistir na vida com o meu glorioso tricolor paulista, naquela época ainda Bi-campeão Mundial.

O São Paulo tinha um jeito de jogar que me fascinava: com uma paciência que fazia a bola passar pelas chuteiras dos dez jogadores na linha; de longos lançamentos; de um contra-ataque rápido pelas laterais; de um zagueiro técnico que ao invés de dar um bico para afastar a bola, dava um corte com tranqüilidade e avançava até ser parado com falta lá na frente do outro lado do campo.

Outro dia quebrei o pau com o meu mesmo tio pelo fato do Santos ter sido campeão paulista jogando um futebol burocrático e robótico, com uma defesa sólida e um ataque medíocre. Um time que ganhou não sei quantas partidas pelo irrisório 1 a 0. O São Paulo, ao contrário, preferiu dar show. Ganhou e humilhou nos clássicos, mas perdeu para times pequenos e sem expressão por deixar a zaga muito vulnerável a cada ataque perdido. "Melhor perder jogando bonito que ganhar de maneira feia", argumentei.

Esse meu jeito de amar o futebol deve-se muito ao Telê Santana. O São Paulo pelo qual me apaixonei quando menino nos meus primeiros jogos no Morumbi era um time que jogava mais ou menos do mesmo modo que as seleções de 82 e 86 dirigidas por ele, que encantaram o mundo pelo jogo ofensivo e mágico.

Em Febre de Bola, Nick Hornby escreve de maneira fascinante como um menino inicia a sua paixão pelo futebol. Por algum motivo que ele não soube explicar, ele se identificou com o estilo de jogo do Arsenal, com marcação forte, zagueiros truculentos e uma torcida beberrona.

Aquele treinador velhinho de cabelos brancos, orelhas enormes e uma inseparável camisa vermelha, via o futebol como algo totalmente romântico. Também sou assim, e vivo tendo por esse esporte maldito mais desgostos que alegrias. Essa última só vem quando vejo um time jogando o chamado futebol arte, sem violência, truculência ou chutões em direção à arquibancada. Um drible de levantar a torcida, um golaço que vira o assunto predileto de uma segunda-feira.

Como Telê gostava.

7 de abr. de 2006

Não, por favor não saiam por aí procurando pelo me retrato estampado em alguma caixa de leite. Sim, estou bem vivinho, e peço desculpas àqueles que ainda insistem em dar as caras por aqui à procura de algum texto novinho em folha.

Nesse mais de um mês sem dar notícias, escrevi muito. Não para o DPL, mas para o meu trabalho, que vem consumindo as minhas energias. Como passo quase todo o dia sentado em frente a um monitor de computador escrevendo e pensando muito, confesso que nos meus horários de folga procuro fazer algo mais divertido. Dormir, por exemplo. Nunca encostar a cabeça no travesseiro e esquecer do mundo foi tão importante para mim.

Para não deixar isso aqui muito vazio, sempre que eu fizer algo de novo para o trabalho, deixarei o texto aqui ou colocarei o link para o site. Escrever isso aqui está difícil, as articulações de meus dedos doem, não consigo escrever mais de 24 horas sem parar...

Por enquanto fico por aqui, e deixo um até breve. Vou tentar voltar ao batente deste blog o mais cedo possível.

Baccio para todos!

5 de mar. de 2006

Personagens de uma notícia de jornal


- Ai, meu Deus!

Mal tive tempo de levantar os olhos para ouvir o grito do motorista. Logo em seguida, o ônibus foi jogado para a esquerda, movimento este seguido de uma freada brusca. Os pneus cantaram, uma mulher que passava pela roleta caiu. Som de uma pancada forte e vidro estilhaçando.

- Cuidado, droga! Ela está grávida! - grita alguém no fundo.

O cobrador pula a catraca e pergunta se está tudo bem com ela. Ela responde que sim, mexendo a cabeça, enquanto põe uma de suas mãos na barriga e ajoelha. O motorista já está na calçada, fita o chão e ouve uma garota berrando e gesticulando muito.

Ela está tão nervosa que dá para ver suas mãos tremendo, enquanto ela guarda o celular na bolsa. Levanto, dou um pulo e vejo alguém estirado. Atropelado. O impacto foi tamanho que o cara - parecia um moleque de rua - foi atirado há uns cinco metros de distância do ônibus.

Todos descem do ônibus. Alguns apressados vão até o ponto mais próximo, outros não escondem a curiosidade fazem uma rodinha em torno do motorista, a mulher nervosa e o atropelado. Um, dois, três motoboys encostam suas motos e vêem a cena. Não consigo pensar direito, e me vejo, sem notar, que estou no meio daquelas pessoas.

O atropelado, um garoto, não se mexe. Será que ele está morto? Jamais vi alguém morto antes. Quando meu avô foi embora, preferi ficar do lado de fora do velório, pois não tive coragem de vê-lo deitado e sem vida. Meu tio tentava me arrastar, dizendo que aquilo fazia parte da vida. Ignorei-o. Sempre quis ter a imagem de meu avô como alguém feliz e ativo. E tinha certeza que vê-lo morto não era a última imagem que desejava ter dele.

Todas as pessoas ficam em silêncio. O atropelado mexe o braço, solta um resmungo. Um outro menino de rua segura a sua cabeça e passa os dedos em seu cabelo. Um som de sirene é ouvido bem de longe. Olho o relógio e vejo que estou atrasado para o trabalho. Não quero mais ver aquela cena.

Entro em outro ônibus e, quando passo novamente pelo lugar, já vejo dois carros da polícia. Bato uma foto com o meu celular.

No dia seguinte, ao ler o jornal, descubro a verdadeira história. O atropelado tem 14 anos, e junto de mais três amigos costumava assaltar pessoas que esperavam o semáforo abrir. Ele roubou o celular da mulher nervosa que berrava e tremia muito, e fugiu cruzando a avenida com o farol vermelho para pedestres. O ônibus não conseguiu frear e o atropelou. O menino que passava as mãos em seu cabelo fugiu assim que a viatura policial chegou.

O atropelado está internado em estado grave. A mulher teve o seu celular de volta. A grávida não perdeu o bebê.

21 de fev. de 2006

Amapá não será mais a mesma



Após saudar fãs oriundos de outros Estados, como Bahia e Santa Catarina, o Bono me solta essa durante o show de agora pouco: "Bem-vindo, Amapá".

OBS: Quem escreveu isso para ele devia estar de sacanagem. Só pode.

11 de fev. de 2006

Mais dois anos


Sentem-se, pois vou lhes contar uma historinha:

Há mais ou menos dois anos, eu estava sentado neste mesmo quarto, olhando para outro computador que ocupava esta mesma mesa. Lembro que, após uns cinco minutos perplexos sem parar de fitar ao monitor, exclamei em direção ao corredor: "Pai, mãe! Entrei na PUC".

Alguns meses antes disso, ainda no cursinho, lembro que escolhi quatro faculdades para prestar Jornalismo: USP, Cásper Líbero, PUC-SP e PUC-CAMP - essa última por ser relativamente fácil de entrar e eu não faria mais um ano de cursinho nem a pau (e eu passei nela super tranqüilo, de fato). Na verdade, eu não me importava com qual faculdade fazer, mas sim em que cidade ela estaria: São Paulo. Então, quando notei que voltaria a morar na paulicéia, já estava feliz da vida.

Quando a gente ainda está no colégio, os professores dizem que na faculdade é onde realmente decidimos o que seremos da vida, que a universidade é o local que nos fará crescer intelectualmente... E eu fui nessa onda. Quando pus os pés na PUC, achei que aprenderia tudo sobre jornalismo, que amaria as aulas, que todos os anos de tortura à base de cálculos geométricos e fórmulas estequiométricas seriam recompensados em quatros anos de faculdade. Ledo engano.

Professores picaretas, matérias sem pé nem cabeça. Tudo o que eu ouvi foram chiados e xurumelas. "Falta isso, falta aquilo, ninguém me paga...". E os alunos pagando o pato. Na escola, eu sempre torci para não ter aula, pois logo pegava uma bola e ia jogar futebol na quadra. Na faculdade, eu torço para ter aula. Para ouvir algo de interessante que me prenda à carteira, e não me faça sair da sala de aula de vinte e vinte minutos por pura falta de saco para agüentar tanta lorota.

Se todas as aulas foram ruins? Não, óbvio que não. Algumas foram bem bacanas - pena que elas mal chegam a contar nos dedos de uma mão só. As aulas práticas, como Laboratório de Jornalismo e Técnicas de Reportagem, foram horrorosas. Preferia ficar no Orkut bisbilhotando a vida alheia a ter que ouvir um professor falar mal toda santa aula da "imprensa burguesa brasileira".

Olha, cansei da faculdade. Tenho ótimos amigos lá, a rosca de brigadeiro da cantina ainda é uma delícia, e adoro minhas idas à biblioteca. Mas fora isso, eu não tenho mais tesão por aquilo. As minhas aulas começariam dia 13, segunda-feira (elas foram adiadas para o dia 2 de março). Eu já me via acordando às seis horas da manhã para chegar naquele prédio e ler um pedaço de papel colado na porta da sala: "O professor fulano de tal não comparecerá hoje por motivos de saúde".

"Faculdade de Jornalismo podia ser feita em dois anos", certa vez disse o jornalista Leonardo Sakamoto. "O professor finge que ensina e o aluno finge que aprende, sendo que ele só está lá esperando pelo seu diploma", continuou.

Olha, desculpem-me, mas não vejo o momento em que terei o meu diploma nas mãos.

5 de fev. de 2006

Reclames


Em meados de 2000, coloquei os meus pés pela primeira vez em uma academia de musculação. Bem, na verdade não era exclusivamente para puxar ferro, mas era uma clinica voltada ao condicionamento físico e reabilitação de atletas. Fui parar nesse lugar por influência de minha mãe e do meu treinador de futebol, que dissera que eu estava muito franzino e precisava ganhar massa magra, vulgo músculos.

Eu realmente era um vara-pau naquela época. Fazia dois anos que eu tinha passado pela famosa "fase do esticão", algo que acontece com todo garoto de 12 a 14 anos. Cresci 15 cm em menos de um ano, e, de gordinho fofo (meu irmão me chamava de Bola de Queijo), tornei-me um magrelo desajeitado e torto. A gordura e os músculos sumiram, restando um pouco de carne com ossos.

Minha cifose era jóia. Meus gambitos levavam ao desespero meus pais, que achavam que eles seriam partidos ao meio na primeira peleja da esquina. E foi por esse motivo que entrei na malhação, puxando barras de ferro e levantando pesos coloridos, onde ficava olhando minha cara de tédio no espelho a cada repetição de exercícios supervisionados por alguma professora gostosinha (algo que dava um pouco ânimo para ir à academia).

Fiz natação também. Em poucos meses fui ficando mais "encorpado". Minhas costas ficam largas e fortes, meus braços mais gordinhos. Lembro que usava uma corrente de baiano no pescoço que começou a apertar a minha jugular, tamanho a largura de meu pescoço. Mas se engana o leitor que me julgue um rato de academia, pois isso nunca fui - e com muito orgulho.

Acontece que querendo ou não, e mesmo ostentando uma barriguinha proeminente, eu era forte. No futebol, se alguém trombasse comigo, eu nunca caia. No basquete, os primeiros arremessos de três pontos entravam e batiam no aro. Isso foi mais resultado da natação creio eu.

E estou enchendo o saco de vocês com este texto entediante, apenas para dizer que não vou à academia há três meses. Se sinto falta? Não, ao contrário; até agradeço. Mas os resultados dessa revolta já estão aparecendo: emagreci quatro quilos, meus braços estão finos e minha postura está voltando a arquear. Não sinto mais a disposição de antes, vivo com sono, e ontem, numa pelada, trombei com um garoto de 14 anos e acabei beijando a grama. Foi bonito, a platéia até riu.

Pior são as dores no pescoço e costas. Estou me tornando um dependente de Dorflex (relaxante muscular). Mas já aviso que, mesmo assim, nem ferrando eu quero ouvir falar em supino ou abdominal. Não pretendo mudar de opinião tão cedo, mesmo com os braços flácidos - minha avó disse que quando dou tchau ou aceno para alguém o meu tríceps balança.

Merda.

2 de fev. de 2006

De passagem

Pois é, amiguinhos, faz tempo que não mostro a cara por estas bandas. Vocês ainda lembram qual é o meu nome? O negócio é que trabalhar consome muito o meu tempo, e aos poucos estou percebendo que sou um maldito workaholic em potencial, do tipo que em dia de fechamento tem problemas estomacais e dor de cabeça, e que fica pensando em trabalho até quando está de folga. Não dou dez anos para eu "ganhar" uma úlcera, vinte para um tumor no cérebro e vinte e cinco para um derrame.

Brincadeiras à parte - ou não - eu volto logo. Agora que a escrita se tornou o meu ganha pão, fica difícil eu arranjar paciência para escrever gratuitamente. Acho que meu cérebro e meus dedos ficaram folgados. Só funcionam sabendo que estou sendo pago, caso contrário eles fazem greve. Uma merda, digamos. Blogueiro que posta quase todo dia é um ser vagabundo, e isso é fato.

E torçam para este blog não acabar em diarinho. Tenho mais vontade em relatar a minha vida do que elaborar uma crônica miraculosa que fará pipocar essa caixa de comentários. Enfim, volto neste final de semana.

OBS: Alguém além de mim torceu contra a indicação de 2 Filhos de Francisco? Pô, imaginem agüentar aquele mala do Zezé di Camargo se o filme da vida dele entra no Oscar? Não sou antipatriota, mas que sequei a película de Breno Silveira, ah, isso eu fiz.

15 de jan. de 2006

Quem acredita em meia-entrada?


Estou aqui, pensando com os meus botões, se essa idéia de "meia-entrada" vale realmente alguma coisa para nós, estudantes ou professores, ou se hoje ela já não passa de pura lorota.

Escrevo isso aqui, indignado que estou, após pagar R$ 8,50 em uma entrada de cinema, e saber que nesta semana que virá, R$ 100 voarão de minha conta corrente com destino aos cofres polpudos de Alexandre Accioly e Luís Niemeyer, responsáveis pela vinda do U2 e Franz Ferdinand ao país.

Li uma entrevista com um dos homens supracitados. "O ingresso é caro em razão da alta aparelhagem do show e da existência de um mercado negro de carteirinhas de estudantes", foi a desculpa dada que mais me chamou a atenção. Escusa feita graças às milhares de reclamações que pipocaram pelo país. Meia-entrada R$ 100? Que porra é essa?

A porra é que todo mundo tem carteirinha de estudante. É fácil tirar uma - certa vez, um repórter da Veja S.Paulo, se eu não me engano, mostrou como é fácil tirar uma (detalhe: ele já estava formado há dois anos). Bastam cinco minutos. É, até certo ponto, uma máfia mesmo. Até rádio oferece carteirinha de estudante! Lembro também de uma matéria que dizia que no cinema do Shopping Santa Cruz, em São Paulo, mais de 90% das entradas são compradas pela metade do preço original (por isso o aumento, dã!).

Mas se engana que a pessoa que pensa que está se dando bem ao adquirir esse pedaço de plástico, cujo poder dá desconto de 50% em futuros eventos. No final, e isso já está comprovado há um tempinho, nós, consumidores, pagamos o pato legal. Pode apostar que esse dia ainda vai chegar; basta uma banda internacional que você adora decolar por aqui ou um baita filme estrear nos cinemas.

Penso seriamente que a solução ideal e mais eficaz é abolir essa cota de meia-entrada no Brasil. Na Argentina, país hermano aqui do ladinho, não existe isso. O resultado é que os preços para cinema, teatro e eventos esportivos ou musicais são muito mais em conta. Ano passado, quando o White Stripes tocou em São Paulo, lembro que paguei R$ 50 para ir ao concerto - 60 pila era o preço a se pegar para ficar em pé na pista. Alguns dias antes, ou depois, Jack e Meg tocaram num lugarzinho da Argentina, pertinho da fronteira com o Brasil. Li mais tarde que alguns fãs brasileiros optaram por ir até o outro país para pagarem mais barato (a entrada para o show morreu em R$ 30).
Jogo de futebol hoje custa mais de R$ 30; cinema quase 20 barões. O que fazemos? Boicote? Seria uma boa, mas isso nunca funcionou. É foda se tocar que o direito à meia-entrada que eu tenho "por lei", na verdade não passa de uma entrada inteira camuflada.

OBS: Um dia depois deste post, o jornal Folha de S.Paulo traz uma matéria com o mesmo tema. Está bem mais completinho, lógico. Vejam!

7 de jan. de 2006

Feliz novo ano

Estava eu, quinta-feira, no ponto de ônibus da Avenida Paulista. Ponto este que por mais de dois anos foi o meu trajeto diário de voltar para casa, em qualquer ônibus laranjinha de nome "alguma coisa Continental". Desta vez eu esperava outro ônibus, agora de cor verde, que me levaria direto ao trabalho - sim, estou estagiando em um lugar bem bacana, há uma semana, mas depois conto isso melhor para vocês.

Um rapaz perto de mim, camiseta verde, cabelo bem curtinho de franjinha à la Brit Pop e usando óculos de armação grossa, folheava um livro, em pé. Admiro quem consegue essa proeza, a de ler em pé. Como de costume, passo perto dele e bisbilhoteio o que lê: Angústia, de Graciliano Ramos. Sempre tive vontade de lê-lo também, pois poucos livros em minha vida me tocaram tanto quanto Vidas Secas.

O ônibus verdinho passa e eu subo nele. Enquanto espero para passar pela catraca, avisto uma garota bonita, cabelos longos e claros, presos por uma faixa. Colar de Pau-Brasil no pescoço, blusinha de renda branca, está com a cara enfiada em um livro. Sento atrás dela, estico o pescoço e noto que ela lê Angústia, como o outro garoto. Deve ser para alguma faculdade, penso, pois tamanha coincidência é meio rara.

Eis que o menino que lia Graciliano em pé espera ansiosamente para passar pela catraca. Olho para ele e observo, que tal como eu, ele também se impressiona com a beleza da garota de cabelos castanhos claros. Ele força os olhos e dá um sorriso, percebendo que a capa do livro que ela lê com tanta atenção é o mesmo que ele guarda debaixo de um dos braços. Passa pelo cobrador e senta - adivinhem ao lado de quem!

Fico extasiado com a cena. Sentado atrás deles, consigo decifrar a cara de pau dele, que abre o seu livro, olha para o lado e solta um falso "não acredito!", cutucando-a de leve. "USP?", ela pergunta. "Engenharia Civil, e você?", ele dispara com um olhar 43. "Psicologia", responde a garota, rindo. Ele engata uma conversa, bobo que não é, e batem um papo sobre vestibulares, faculdades, cursinhos e professores chatos - coisas que todo vestibulando adora falar.

Esqueço um pouco deles e penso na vida, que em 2003 eu estava na mesma situação que os dois, prestando vestibular, e não sabendo como seria a minha vida no futuro. E lembrei que dois meses depois eu já morava em outra cidade e fazia o curso que eu tanto sonhei um dia fazer. E que um pouco depois eu namorava pela primeira vez, e achava que tudo o que eu almejava acontecia muito rápido e isso me fazia a sentir a pessoinha mais feliz do universo - exatamente como me sinto hoje, ao escrever esse texto ouvindo Clap Your Hands Say Yeah!, banda indie bem legalzinha, no som do meu quarto em Sorocaba.

Ah, em relação aos dois vestibulandos, digo que o rapaz mandou muito bem. Antes de descer em seu ponto, ele pediu para a menina se podia adicioná-la no Orkut. Ela respondeu positivamente, fazendo charme e dizendo "Eu não tenho caneta nem onde escrever". Ele balançou os ombros, como se dissesse "não tem problema, tenho uma caneta aqui na minha mochila". E foi isso que ele fez, dando a caneta para ela. Ela esperou e disse: "Mas onde eu posso escrever para você?". "Aqui mesmo", ele respondeu de lata, tirando o seu exemplar de Angústia do colo.

Depois ele foi embora e, juro para vocês, que ele chegou a dar um pulinho de alegria ao atravessar a rua.