16 de ago. de 2009

Entrevista com os vampiros



LOS ANGELES - "Nosso show é mais real o que os outros. Olha, acho que se Los Angeles fosse invadida agora mesmo por vampiros, eles seriam assim. Se é que isso faz algum sentido": a atriz Rutina Wesley profere a frase e solta uma gostosa gargalhada para resumir a um grupo de jornalistas (que inclui este, do Estado) o que o elenco de True Blood passa.

A produção da HBO, que está na 2ª temporada e é hit de audiência na televisão (e na web), segue a moda de trazer livros de sucesso sobre esses seres sobrenaturais para as telas – seja do cinema ou da TV. Além do fenômeno teen Crepúsculo, em novembro chega ao Warner Channel o seriado Vampire Diaries.

A comparação é inevitável e rende comentários pouco ortodoxos. "True Blood é mais f.., para os adultos. Crepúsculo é para minha irmãzinha", alfineta o ator Nelsan Ellis, o "discreto" Lafayette.

Na história criada pela escritora Charlaine Harris e adaptada por Alan Ball (leia mais aqui), japoneses criam a bebida Tru Blood, que simula o sabor do sangue. Assim, os vampiros não precisam mais sair à noite atrás das jugulares alheias. Poucos aderem à novidade – caso de Bill (Stephen Moyer), um elegante "sugador" centenário que se apaixona pela garçonete Sookie (Anna Paquin). Ela se interessa pelo imortal por um motivo: é telepata e sempre sofreu com esse dom. Mas não consegue ler a mente dele. Afinal, ele está morto!

True Blood não é mais uma história sobre o relacionamento de um vampiro com um ser humano. É um drama com piadas de humor negro, que faz da inserção dos vampiros na sociedade uma metáfora para falar sobre os preconceitos sociais e morais que existem nos EUA.

O seriado caiu no gosto do público e da crítica, que deu a Anna o Globo de Ouro de melhor atriz. Mas quem rouba as cenas são os coadjuvantes. "O show não é apenas sobre Sookie e Bill brincando na cama", ri Anna. "Aqui não tem a presença do personagem principal. Você vê 12 histórias diferentes que se conectam", completa Rutina, a elétrica Tara.

PROTETOR SOLAR FATOR 50

A série é rodada durante seis meses em New Orleans, Luisiana. Sua produção tem várias curiosidades. Para ficarem com a aparência pálida, os vampiros não se submetem apenas a muito pó de arroz. "Não vou à praia e uso protetor solar número 50", ri Alexander Skarsgård, que faz o vampiro/xerife Eric. As olheiras também não são fruto de pura maquiagem.

"Agora a gente grava muitas cenas em estúdios, mas no primeiro ano eu sofri. Só tinha cena externa, à noite, porque não podemos sair ao sol", explica Moyer que, ao lado de Skarsgård, provoca os instintos mais primitivos das telespectadoras. "Senhoras pedem para tirar foto comigo na rua. Daí viram o pescoço e pedem: ‘me morde?’", ri ele, que teoriza sobre o sucesso. "Os vampiros são seres de outro tempo, têm aquela aparência gótica e são românticos. Isso é muito atraente", diz. "Além do mais, somos fortes, poderosos e com uma energia sexual incrível!"

Mas o assunto que mais rende entre os atores é o sabor do sangue fictício, mistura de xarope com corantes. Skarsgård gosta, diz que é doce. Já Anna... "No primeiro dia perguntaram se queria o sangue com açúcar ou sem. Tomo refrigerante diet, então já viu... É horrível e tem gosto de bunda", resume.

Nota: agora, o sangue que ela bebe é xarope de morango.

Entrevista com Alan Ball: "VAMPIRISMO É PURO SEXO"

O nome de Alan Ball foi citado durante toda a entrevista com o elenco de True Blood. Um show assinado pelo criador de Six Feet Under, roteirista ganhador de Oscar (Beleza Americana, 2000), foi o motivo que mais pesou na hora de convencer os atores a fazerem testes para a série – além de ser uma produção da HBO, claro. Antes de ser paparicado pelo elenco, Ball falou ao Estado.

Por que hoje temos tantas produções sobre vampiros?
Faço uma piada que é porque nós tivemos, aqui na América, nos últimos oito anos, um vampiro presidente que nos sugou até nos deixar secos (risos). Honestamente, não sei dizer por quê. Os vampiros sempre foram seres atemporais.

Por quê?
Eu acho que existe essa tensão sexual, desde o Drácula de Bram Stocker e da Era Vitoriana. Sexo era algo escondido, essas histórias eram uma boa metáfora para falar de sexualidade. Se você pensar, o ato do vampirismo, de peles penetradas e fluidos corporais sendo trocados, é totalmente sexo.

O show usa a inserção dos vampiros na sociedade como uma metáfora para falar do racismo e do fanatismo religioso na sociedade americana. Como você criou essa abordagem?
Isso já estava nos livros e foi um dos motivos que me fizeram gostar tanto deles. Porque parece fresco. Comprei o primeiro livro da série por impulso: estava 20 minutos adiantado para uma consulta no dentista, então dei um pulo na Barnes & Noble. Algo me disse "compre". Se fosse uma história tradicional de vampiros, eu não teria gostado. O jeito com que ela (Charlaine) trata as questões sociais e faz do vampiro uma metáfora para isso, como o culto e a fantasia de se transar com um, de beber seu sangue, ou mesmo a perseguição religiosa, foram sacadas que transformam a obra num entretenimento legal, sexy e assustador.

Por que na série temos mais personagens afro-americanos do que na obra original?
Bem, estamos falando de uma Luisiana, então como não ter grandes personagens afro-americanos? O único que existe nos livros, de real importância, é o Lafayette. Já a Tara é só uma amiga da Sookie e eu não quis que ela fosse mais uma caucasiana bonitinha.

'True Blood' e 'Six Feet Under' estão relacionados com a morte, de certa forma. Esse é um assunto que o fascina?
Passei cinco anos num show que trabalhava com o fato de que todos vamos morrer um dia. Pensei: "O.K., acabei com esse lado pesado." E o livro me pegou por ser engraçado! True Blood não mostra a realidade da morte, é um cartoon, não é o vilão de Six Feet Under. Por causa do acidente de minha irmã (ele a viu morrer em um acidente de carro), tenho outra percepção da morte, é algo que me fascina. Recentemente perdi um cão e realmente fiquei de luto. Mas é um assunto que não me assusta mais: agora fico em frente a um túmulo, choro por quatro minutos e sigo em frente. Quando perde-se alguém que ama, você a homenageia com sua dor, mas depois deve entrar em paz.

* Matéria publicada no Estadão

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