14 de set. de 2008

Acho que eu nunca gostei de um filme baseado em um livro do qual adorei muito. No sentido de ler a obra primeiro e depois conferir a sua adaptação para a sétima arte. Creio que isso deva acontecer porque na literatura tem todo aquele lance de imaginar e, querendo ou não, o audiovisual MOSTRA e por isso MATA um pouco a imaginação.

Para vocês terem noção, não tive coragem ainda de alugar o DVD de O Amor nos Tempos do Cólera. Isso porque quando terminei o livro de Gabriel García Márquez, fiquei uns 10 minutos olhando para o teto do meu quarto pensando como tal história renderia um belíssimo filme.

Todo esse nariz-de-cera serve para dizer que ontem eu fui ver a adaptação de Fernando Meirelles para Ensaio Sobre a Cegueira. E não gostei. E odeio dizer isso porque parece que estou querendo pagar de crítico. Mas na verdade é que estou há quase 24 horas sem conseguir deixar de pensar no que assisti nesse último sábado.

O filme não é ruim. É bem filmado, os atores são bons (tirando o coreano). Mas a minha impressão é que Meirelles não soltou o filme confiante - ele mesmo diz que deseja mudá-lo toda vez que o vê. Parece que ele teve medo da pressão de filmar um livro dito infilmável e talvez devesse ter tido um pouco de ousadia e interpretasse as metáforas escritas pelo português. Não ficar tão preso em passar para a tela exatamente aquilo que Saramago escreveu, sabe?

A história é difícil, abstrata, não tem explicações mesmo. Mas, no livro, Saramago aponta uns caminhos para que a imaginação do leitor voe longe a fim de buscar explicações para a tal "cegueira branca". No filme eu não consegui refletir em nenhum momento. Fiquei curioso em saber como era a primeira edição do longa, que tinha mais narrações em off do personagem de Danny Glover. Talvez ajudasse.

[Não estou aqui defendendo filmes que façam pensar, por favor. Sou fã de blockbusters e tudo mais, mas é que Ensaio Sobre a Cegueira, para mim, tinha essa "obrigação".]

Lembro que no livro várias cenas me impressionaram. No filme, nenhuma. E não estou falando do ausência da cena do estupro coletivo, que foi atenuada na edição comercial. É no sentido de que tudo me pareceu meio retocado, fake, não querendo chocar muito e até buscando o humor - vide os cegos peladões, que fizeram a alegria da platéia.

Ainda me irritei bastante com o merchandising que correu solto e chamou muito mais atenção do que deveria. Era o novo carro da Fiat sendo exibido por todos os ângulos possíveis, a loja do Herchcovitch no meio de tantas outras quebradas e sem nome, o logo colorido da C&A resplandecendo no meio da bela fotografia branca, de luz quase etérea.

Mas valeu a tentativa, Meirelles. Pelo menos tu não ficou naquela de apenas filmar os problemas do Terceiro Mundo. Isso te deixa com bons créditos.

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