16 de dez. de 2009

Ale Rocha: "o blog é a minha terapia ocupacional, não um trabalho"

Ale Rocha é um exemplo. Não apenas no jornalismo, por coordenar um dos principais blogs brasileiros sobre TV, o Poltrona, mas também na vida. Ele sofre de uma rara doença há 3 anos, a hipertensão pulmonar primária, que exige dele repouso absoluto. Mas Rocha, de 33 anos, luta contra prognósticos e, sempre perto do computador e do iPod Touch (futuramente, será um netbook), diretamente de sua casa em Mogi das Cruzes, região metropolitana de São Paulo, solta furos, notícias em primeira mão e faz a alegria daqueles que curtem os bastidores da televisão.

Em uma semana em que teve uma das piores crises desde o diagnóstico da doença, Rocha está sem postar nada de novo no premiado Poltrona. Muito gentil, ele aceitou o convite do Virgula de contar um pouco a sua história. "Hoje, olhando para trás, vejo que a doença proporcionou coisas bacanas. Tive um filho após o diagnóstico. Criei algo, o Poltrona, e fui reconhecido por isso. Claro que preferia tudo isso sem a doença. Talvez estivesse melhor sem ela, mas não posso dizer que tenho uma vida ruim".

Anotaram?

Você sempre morou em Mogi das Cruzes?
Então, sou paulistano. Morei na capital até o começo da adolescência. Meu pai foi transferido e morei em Mogi durante a adolescência. Voltei para São Paulo para estudar, trabalhar, casar e ter meu filho. Veio o diagnóstico da doença e acabei retornando para Mogi, pois procurava uma cidade mais tranquila, mas que fosse próxima a São Paulo, por causa de meu tratamento no Incor (Instituto do Coração). Entrei na faculdade em 1996. Meu objetivo era ser jornalista esportivo. Durante o curso, consegui um estágio no recém-lançado Lance!. Fiquei lá por dois anos, entre estágio e freelancer. A experiência foi boa, mas observei que o jornalismo esportivo não era minha área. Logo depois conheci a comunicação institucional e minha carreira seguiu este rumo.

E a TV, onde que entrou nessa história?
Trabalhei durante cinco anos no terceiro setor, em uma ONG que estimulava o investimento de empresas na área social. Comecei na área de comunicação e, com o tempo, acabei orientando algumas organizações em suas ações sociais. Durante o tempo em que trabalhei nesta ONG, fiz uma especialização em terceiro setor e outra em gestão de projetos. Depois fui para uma grande empresa farmacêutica. Foi aí que tive o diagnóstico de hipertensão pulmonar primária. Inicialmente fui licenciado e, depois, aposentado pelo INSS. Nos primeiros meses de licença médica, um amigo sugeriu que eu escrevesse um blog para me ocupar. Na hora em que decidi o tema, veio TV. Sempre gostei de televisão, desde moleque. Minha mãe conta que aprendi as primeiras letras e números com Vila Sésamo, no final dos anos 70.

Um blog que, hoje, é um trabalho
No começo era um hobby. Aliás, ainda é. É uma terapia ocupacional, não é um trabalho. O blog começou com poucos leitores, sobretudo amigos e parentes. Comentava notícias sobre TV que lia nos meios de comunicação, programas e séries que assistia. Com o tempo fui ganhando leitores, entre eles profissionais de TV ou jornalistas que cobrem o assunto. Aí veio o destaque, o crescimento da audiência, os furos, os prêmios e o livro (http://www.poltrona.tv/sobre/). O diagnóstico da hipertensão pulmonar ocorreu em dezembro de 2005.

Você atualiza o Poltrona apenas de casa? Sua doença exige repouso absoluto

Fui aposentado em janeiro de 2008. Nunca tive uma postura pró-ativa com o Poltrona. Sempre recebi propostas e convites. Isso inclui os furos. Recebo informações em primeira mão, por telefone, e-mail ou MSN. Outras notícias não são propriamente furos, mas acabam sendo publicadas primeiro pelo Poltrona. Tenho um escritório em casa com toda a estrutura necessária - computador, banda larga, TV por assinatura e DVD. Daqui acompanho cerca de 150 sites e blogs nacionais e internacionais, vejo TV e DVDs o dia inteiro, acompanho Twitter, converso com pessoas pelo MSN e telefone.

Deve ser difícil não pode ir a eventos e coletivas

Realmente vou pouco a eventos. Além de não estar em São Paulo, onde a maioria dos encontros, cabines e coletivas acontecem, há a questão da dificuldade de locomoção. Um dos sintomas da hipertensão pulmonar é o cansaço extremo em pequenos esforços. Um simples levantar do sofá, dependendo de meu estado de saúde, pode levar ao desmaio. No princípio era mais fácil ir a eventos. Morava em São Paulo e a mobilidade era maior. Hoje é mais difícil. A doença é crônica, ela avança mesmo com o uso de remédios. Não há cura. Seleciono alguns eventos para ir: se acordar em um bom dia, posso tentar ir. Para isso conto com a ajuda de familiares que me levam, pois não posso dirigir. Em alguns casos, uso cadeira de rodas. Se não acordo em um bom dia, me resta ficar em casa e poupar energia.

Quando você percebeu que estava se tornando uma referência na área? No primeiro furo?

Não foi propriamente um furo, mas a primeira notícia que repercutiu foi um áudio que postei no YouTube com a discussão entre um pastor do Fala que eu te Escuto e uma telespectadora que o criticava e o acusava de preconceito contra outras crenças e religiões. O post virou notícia na Folha Online, isso aconteceu em janeiro de 2007, dez meses após a criação do blog. Até ali, ele crescia bem vagarosamente. Em dezembro de 2006, tinha uma média de 250 visitantes por dia. No mesmo em que ganhei destaque na Folha Online, saltou para 450. No mês seguinte, atingi 900 visitantes e o número foi crescendo.

Ao fazer os publieditoriais, vulgo posts pagos, você não acredita que põe sua credibilidade em risco?
Primeiro, acho importante deixar claro quando um texto é pago. Para isso, uso um selo e os arquivo na categoria Publieditorial, sem o uso de tags, que no Poltrona servem para indicar os nomes das atrações. Acredito que se tomar esses cuidados, dificilmente o leitor se sentirá incomodado. Eu adoto algumas práticas: primeiro, tem que ser assunto relacionado à TV. Outra coisa diz respeito à abordagem. Se não vi a atração, não elogio. Faço um post informativo. Falo sobre o programa, elenco, história, horários de exibição, cito caminhos para mais informações... Até hoje, só opinei em um caso: True Blood. Sou fã da série, acompanho com a exibição norte-americana.

Você se considera um exemplo, pela maneira como lida com a vida?
Algumas pessoas dizem que sim. Talvez seja. Fico feliz com isso, mas não é meu objetivo. Boa parte do que aconteceu é fruto do acaso. Desde o diagnóstico da doença até a criação do blog e os motivos que o fizeram crescer. Só descobrimos a força que temos quando somos testados, colocados à prova. Acho que é instintivo. Sim, luto diariamente. Mas não há nada de especial nisso. Qualquer pessoa lutaria, todos nós queremos viver! Se alguém me falasse no começo de 2005 que em alguns meses eu teria o diagnóstico de uma doença rara, sem cura e fatal, eu provavelmente iria entrar em parafuso. Aliás, entrei. Os primeiros meses foram barra pesada... Mas, depois, o tempo torna as coisas mais serenas. Os desafios crescem, mas há sempre a questão da adaptação.

Você poderia explicar um pouco sobre o que é a hipertensão pulmonar primária? E qual o seu estágio hoje?

É um pouco abstrato, mas vamos lá: é uma doença rara, crônica, sem cura e potencialmente fatal. Não há estudos atuais, pois alguns remédios novos entraram no mercado, mas pesquisas da década de 90 indicam sobrevida de três anos após o diagnóstico. Em suma, há um um aumento progressivo na resistência vascular pulmonar levando à sobrecarga do ventrículo direito e, finalmente, à falência do ventrículo direito e morte prematura. Entre os sintomas estão falta de ar, cansaço em pequenos esforços, síncope (desmaio) ou quase síncope e edema (inchaço) periférico. Com o avanço, há aperto no peito e dor similar a angina, também presente no infarto.

Existem quatro classes funcionais. Estou no grau mais avançado, a Classe IV. Tenho inabilidade para realizar qualquer atividade física sem sintomas. Apresento falência do coração direito, além de dispnéia (falta de ar) e fadiga em repouso.

Você disse que o blog é sua terapia. Ele o permite criar planos futuros?

O blog é minha terapia. Além disso, é uma forma de contato com outras pessoas. Se eu ficasse vendo o tempo passar, certamente enlouqueceria. É uma forma de me ocupar e fazer planos. Tenho planos pessoais e para o blog. No momento, aguardo a decisão dos médicos para ingressar na fila de transplante pulmonar. O transplante é uma complicado, cheio de riscos imediatos e posteriores, mas certamente melhorará minha qualidade de vida. Por isso, faço planos desde os mais simples, como ir a encontros, coletivas e cabines para imprensa, como, quem sabe, conhecer estúdios nos EUA e participar de eventos por lá. Convite já há.

* Matéria publicada no Virgula

2 comentários:

Lindinha disse...

Olá,tb tenho HAPI ,diagnosticada desde 2005,era professora e tive que aposentar por "INVALIDEZ",de lá pra cá venho levando a vida no maior tédio,gostaria de comunicar-me com vc para troca de experiências.
Olinda

Anônimo disse...

leggere l'intero blog, pretty good